Acesso aqui.
Password: 123456 / Meeting ID: 899 2722 5933
1. Comunicação do académico Senhor Leonel Ribeiro dos Santos, intitulada Um filósofo com os pés na Terra: O pensamento geográfico de Immanuel Kant.
Resumo: Há filósofos que se tornaram tão famosos por alguma de suas obras ou por algum aspeto do seu pensamento que essa fama por que ficaram e são vulgarmente conhecidos ofuscou ou fez mesmo esquecer por completo os outros aspetos em que se exprimiu a sua personalidade especulativa. O efeito desse ofuscamento ou esquecimento não prejudica só a adequada compreensão da sua mais plena fecundidade científica, mas também prejudica a correta apreciação daquilo por que se tornaram mais famosos, pois, isso mesmo, com frequência, é apreciado sem a adequada contextualização na complexa arquitetura da sua mais densa visão do mundo. Opera-se, então, ora o arbitrário secionamento da produção do filósofo em diferentes fases ou períodos (no caso de Kant, entre o chamado “período pré-crítico” e o “período crítico”), estipulando algum deles como sendo aquele que canonicamente o representa, ora se ordenam os respetivos escritos segundo uma hierarquia de classes, considerando uns como “maiores” ou importantes e outros como “menores”, atribuindo a estes muito pouca ou nenhuma relevância para a compreensão do seu pensamento e legado filosóficos.
Em geral, a apreciação da filosofia de Kant e até mesmo a mais qualificada hermenêutica levada a cabo pelos mais conceituados especialistas do Kantismo, com muito raras exceções, tem estado reféns desse vício ou preconceito hermenêutico. É assim que, ao fim de duas centenas de anos de intensa produção de exegese e hermenêutica, pode ainda dizer-se que há aspetos da obra do filósofo que só muito recentemente começam a ser objeto de atenção. Ora um dos aspetos que tem sido mais descurado é o seu pensamento geográfico, podendo dizer-se que é este o último território ainda por descobrir e explorar no legado filosófico e científico de Kant. E, todavia, Kant foi professor e cultor da Geografia, tendo ele mesmo introduzido a disciplina no plano de estudos da sua universidade, e tendo-a lecionado ininterruptamente desde o primeiro ao último ano da sua vida académica (1756-1796). Essa lecionação e ocupação não era para ele algo marginal ou secundário, mas afeta profundamente a sua conceção geral da filosofia, podendo dizer-se que o seu pensamento filosófico é configurado pelo seu pensamento geográfico, pois a linguagem, a metafórica e a envolvência geográficas dão o tom e determinam a estrutura narrativa profunda da sua filosofia transcendental. E, da mesma forma, o seu pensamento geográfico constitui-se como a base e o pressuposto da sua antropologia física e pragmática, da sua filosofia da história, da sua filosofia do direito e da política, dando a estas uma indelével intenção e configuração cosmopolita.
Sob o título proposto para esta comunicação, não se visa, pois, apenas ver como Kant ensinava e concebia (ou o que pensava sobre) a Geografia enquanto disciplina. Mas, para além disso, mostrar como ele tinha uma mente e imaginação geograficamente configuradas, o que o levava a colocar até os problemas da “razão pura” em formatação e linguagem geográfica ou geográfico-política; e reconhecer o quanto a filosofia kantiana da História e da Política estão determinadas por uma visão da condição terrena da espécie humana – do homem como cidadão da Terra. Em suma, trata-se de compreender como o seu interesse pela Geografia conduz os seus interesses filosóficos maiores, seja no plano teorético ou no plano prático-político. Há uma estrutura representacional geográfica que subjaz ao discurso e pensamento kantiano e os rege. Desse modo, a expressão que ele próprio usou num passo da Crítica da Razão Pura (A 760 / B 788) para caraterizar David Hume, como «um dos geógrafos da razão humana», pode com muito mais propriedade e pertinência aplicar-se a ele próprio.
2. Comunicação do académico Senhor Renato Flôres, intitulada O Mundo que o Covid Mudou: EUA, China e Potências Intermediárias na Nova Ordem Internacional.
Resumo: Apresenta-se, de forma sucinta, os pontos principais contidos na obra “The World Corona Changed: US, China and Middle Powers in the New International Order”, a sair no final de agosto, conforme a informação abaixo,
https://www.routledge.com/The-World-Corona-Changed-US-China-and-Middle-Powers-in-the-New-International/Jr/p/book/9780367763831 .
Duas questões fundamentais deverão orientar a análise das diversas questões dessa nova realidade:
* o estado em que se situarão as relações entre a China e os EUA;
* o grau de cooperação internacional entre as diversas nações.
A primeira será determinante em como os grandes temas pós-pandemia deverão se orientar. Em que pese as diversas e profundas interações entre os dois países, não é certo que seguirão um percurso sereno, sendo mais provável que rupturas -parciais, em determinados aspectos e segmentos, ou até total- haja, o que levará a resultados e desenvolvimentos fragmentados para diversas situações.
Ao lado disso, após a em geral decepcionante falta de cooperação entre as nações durante a pandemia, paira real dúvida sobre o destino desse fator essencial para o bom e construtivo equacionamento das relações internacionais. Se houver uma real intenção de melhoria, isso poderá atenuar os efeitos negativos de uma piora nas relações China – EUA. Todavia, existe alta probabilidade de uma deterioração conjugada, que levará quase a uma divisão do mundo em dois blocos.
Se imaginarmos um plano definido por dois eixos associados a essas duas questões, diversas interrogações, como o futuro das cadeias de valor, ou a possibilidade de uma regulação básica comum para a segurança e proteção de dados, podem ser analisadas de modo mais realista, conforme o quadrante em que evoluirão.
Esse arcabouço não é porém suficiente, uma vez que diversas potências intermediárias podem e deverão exercer influência significativa em muitos casos, sobretudo em âmbito regional. Ao lado das “middle powers”, as instituições internacionais, em que pese o momento de menor prestígio que estão a viver -e que continuará a curto prazo- podem ter papel importante.
Não se prevê um conflito violento entre as duas superpotências, nem tampouco uma situação análoga à da antiga Guerra Fria, onde os espaços de atuação eram razoavelmente delineados, o grau de interação entre os dois poderes (parcialmente) hegemônicos restrito e o equilíbrio nuclear explícito.
Uma Guerra Tecnológica é, por outro lado, inevitável, e já se encontra em curso. Devido a isso, o livro também discute a ‘Galáxia Digital’, que ganhou proeminência durante a pandemia, e será um fator relevante em diversas áreas futuras. Não se apresenta uma visão muito otimista quanto a essa dimensão, seja pelo abrangente e perigoso aumento no controle da cidadania que proporciona, seja pela assustadora concentração vigente entre os seus principais atores: as grandes plataformas digitais e os criadores de aplicações e algoritmos. Maior controle e desigualdade parecem inevitáveis.
Elabora-se sobre as combinações possíveis dos elementos acima. De um modo geral, as avaliações e considerações apontam que o mundo alterado pelo covid não será nem uma continuação do anterior, nem uma versão onde certos setores sofreram acelerações ou retrocessos.
A “nova normalidade” será distinta e, lamentavelmente, mais desigual em múltiplos aspectos, com sociedades mais controladas e menos solidárias internacionalmente.
O debate com os Confrades será fonte enriquecedora e teste indispensável para as ideias expostas.